sábado, 2 de julho de 2011

"A desafinar o silêncio dos descontentes" por José Antônio Moreira.



O ataque às organizações sociais e sindicais dos trabalhadores representa um duro golpe desferido contra a democracia e o valoroso (apenas em discurso?) exercício da cidadania.

No contexto da greve dos trabalhadores da educação de Mato Grosso a afirmação com que inicio este texto ganha um sentido específico, pois na última terça-feira o governador do estado Silval Barbosa vem a público ratificar a sua posição de não dialogar com grevistas. Esquece-se (ou ignora) que a política (utilizo as palavras do filósofo Karl Jaspers) trata da livre coexistência e, portanto, subjuga a violência por meio do debate, do pacto, da busca de uma vontade comum através de caminhos legais e éticos. Logo, a postura do governador não está em consonância com a posição que ocupa. Mas, vamos adiante, à sua incoerência.

Silval Barbosa ao afirmar que não negocia com grevista se esquece (ou prefere ignorar) que seu governo ofereceu aos funcionários – paralisados! - da EMPAER uma contraproposta (aceita pelo sindicato da categoria) que estabelece uma recomposição salarial imediata de 35 %, somado ao mesmo percentual (35%) para 2012 e mais 30% para 2013. Segundo informações divulgadas pelas mídias o acordo foi costurado pelo secretário de Desenvolvimento Rural e Agricultura Familiar juntamente com o secretário de Administração do Estado. Compreendemos, assim, que o seu discurso não condiz, neste caso, com a atitude por parte de seu governo. Mas isto me leva a outra questão: como tem se comportado a secretária de Educação ante a paralisação?

É sintomático que as escolas de Cuiabá e Várzea Grande tenham feito reuniões, realizadas sempre nos mesmos dias - de maneira orquestrada - para discutir o retorno às aulas, forçando decisões unilaterais que ignoram a decisão soberana da Assembléia Geral da categoria. Os trabalhadores da educação se viram diante de coerções de todo tipo. Num primeiro momento, a coerção nas escolas, por meio de alguns diretores e coordenadores (e fomentadas por quem?). Num segundo momento, a intimidação passa a se dar por meio e a partir da liminar concedida pelo desembargador José Tadeu Cury - para quem a greve dos professores é ilegal - em favor do governo do Estado. Mas também me pergunto: por que alguns membros da direção do Sintep, durante algum tempo pareceram poupar a secretária de críticas? Dentre outras coisas percebo dois aspectos: um talvez seja o temor de que o PT perca a secretaria, o temor de que “companheiros” percam certos privilégios, certas ocupações no Estado; o outro, remete-me ao laço afetivo de alguns trabalhadores com o PT, digo laço afetivo pois não se trata da luta por uma causa comum nem mesmo da postura ou dos resultados alcançados pelo partido no poder. A questão é: tanto um aspecto como outro tem, no mínimo, silenciado muitos.

O ato público da última quinta-feira (comovente, por sinal) foi combativo se não pensarmos no silêncio ante o Palácio do Governo após a entrega, por meio do ex-deputado Alexandre César e do deputado Valmir Bruneto, da “nova” (velha) proposta do Governo do Estado. E curiosamente após a leitura da mesma, o silêncio reinou mesmo após seu conteúdo ser exposto (sem nada de novo) – assombrou-me a indiferença da maioria do movimento ante o grito daqueles que desafinavam o mesmo silêncio. O que esse silêncio quis comunicar? Prefiro aguardar. Vamos à única conclusão possível até agora.

A obrigação moral deve emergir de todos esses escombros, e o compromisso ético com a educação deve prevalecer nos esclarecidos, para quem lei e ética não são a mesma coisa (curiosamente era isso que ensinava aos meus alunos de terceiro ano, quando foi deflagrada a greve). Podem se fundir em algum momento, mas em outros (muitos) não: quando a Justiça se configura num sistema de leis que legaliza a injustiça (utilizo aqui as palavras de Millor Fernandes) cabe a nós, às vezes, sermos ilegais para preservar a ética. Disso depende a ética (como aponta o filósofo político e professor da USP Renato Janine Ribeiro): de pequenos atos de heroísmos. Não nos esqueçamos: a nossa permanência em greve ante tanta coerção representa um ato heróico. Termino este texto com o único conforto possível neste momento: um abraço fraterno em cada um dos companheiros (as) professores que, em meio a tanta prepotência e truculência, tem permanecido forte em nome de um valor mais elevado. Disso depende a dignidade de cada um de nós, disso depende a dignidade humana.


* José Antônio Moreira é professor de Sociologia.

6 comentários:

  1. Bruno, mande-me um email pois quero retificar um detalhe no texto. bomselvagem@gmail.com.

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  2. Bom dia, prof, otimo texto, vossa senhoria só esqueceu de falar da dignidade dos alunos que estão sem aulas e para qual a escola foi criada e existe. Essa falta de aula e de conhecimento é etica? a escola existe pra que?

    abraços

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  3. Parabéns José Antônio! A tua reflexão foi brilhante, principalmente quando os temas "ética" e "justifiça" se entrecruzaram. Realmente, existem momentos históricos que os mesmos chegam a ser antagônicos e é preciso sempre se adotar uma postura ética, mesmo que seja ilegal. É nesse ponto que a greve, considerada "ilegal" pelo Desembargador José Tadeu Cury, se encontra. Foi neste ponto que igualmente a luta de Gandhi, Martin Luther King, dos Panteras Negras, Zapatistas, entre tantos, também estiveram (ou estão).

    Sobre o questionamento do anônimo de cima, essa dignidade dos alunos sempre foi violada com a péssima educação oferecida nos estabelecimentos públicos. Esta dignidade é violada nos 200 dias de letivos. A greve é um momento de reverter isso, de tentar melhorias, que infelizmente não puderam ser obtidas por outras vias. A Greve é uma negação dessas condições e, paradoxalmente, a afirmação de novas possibilidades, de uma escola melhor com profissinais valorizados. Por fim, esta dignidade dos alunos já foi massacrada, quando a Educação foi jogada para última prioridade pelos governantes coronéis do nosso estado...

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  4. Prof.Carlos César; Sou profesor de História na rede pública de MT: Quando vc sita alguns teoricos tbm podemos dizer o que Tomas Hobbes diz "Ter o Poder apenas pelo poder..." Infelizmente em nosso país mais de 90% dos politicos querem o poder nao para exerce-lo de forma digna e correta mas apenas para seu "bel prazer".... e complementando o que foi dito sobre o papel da escola na sociedade.. é só lembrar que na primeira contituinte republicana não trazia a educação como uma prioridade do poder publico... ou seja no Brasil educação nunca foi e dificilmente será uma prioridade para nossos governates, umas vez que para "eles" ser alfabetizado basta soletrar algumas palavras e escrever seu nome é so lembrar da propaganda que o governo "LULA" mantia na midia sobre o Brasil alfabetizado..." para que ter um povo que pensa reflite e discute os assuntos aleios ao país... eles sabem muito bem que quando isso acontecer "eles" estaram em maus Lenções....
    UM ABRAÇO A TODOS....

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  5. boa noite, ótimas colocações, só surgiu uma duvida:
    quando sua senhoria coloca: Sobre o questionamento do anônimo de cima, essa dignidade dos alunos sempre foi violada com a péssima educação oferecida nos estabelecimentos públicos.

    Esse paragrafo deixa subentendido que é o governo que ministra aulas, já que a educação oferecida é de péssima qualidade. Logo a culpa é d governo, seria isso? Mas caro colega, quem esta todos os dias dentro da sala não é o governo e sim nossos digníssimos professores. Sendo assim, a luta pela qualidade da educação não pode se limitar a critica construtiva ou não ao governo, é preciso fazer uma autoavaliação de vários fatores envolvidos nesse delicado tema chamado educação.
    Talvez esse Art. 1º da LDB melhore nosso entendimento: A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais.


    abraços.

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  6. Prof. Carlos César: SIm quem esta em sala de aula todos os dias somos nos professores... nas não podemos esquecer de um detalhe muito importante. Para ser um bom profisional nao basta apenas uma boa faculdade, mas tempo pra prepara aulas elaborar provas corrigi-las, e para adquirir bons livros para leitura e isso requer tempo e dinheiro, com um salario bruto de 1.312,00 o amigo acha que é suficinte? o que leva o professor a trabalhar tres turnos para pelos menos ter uma alimentação mais digna.... sendo assim eu concordo que temos alguns profissionais que so estao em sala para garantir o pagamento e nao estão comprometidos com o aprendizado dos educandos... mas com um salario assim acaba compromentendo todo o desempenho da educação... e tbm sabemos que educação ela tem que ter um comprometimento da familia da sociedade e nao so da escola... como professor eu ja ouvi e nao foi poucas vezes pais dizerem "prof. ver o que vc consegue ai porque eu nao sei mais o que fazer" ou "prof. dou graças a Deus quando meu filho vem para escola eu tenho um momento de paz em casa". E vale lembrar que hoje a crinça entra com seis anos na escola e vai ate a 8ª serie sem rentenção alguma ou seja so nao pode ter mais que 600 falta acada tres anos o restante nao tem importância e so ver o alto indice de reprovação nos primeiros anos do ensino medio ja parou para pensar o motivo pelo qual quarem ciclar tbm o ensino medio?... quando discutimos ética devemos lembrar que o que é ética para nos com certeza nao é para os politicos... e so lembrar do que Tomas Hobbes diz "sobre a relação amigo inimigo na política"

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